O que toda mulher cristã precisa ler sobre Feminismo?

Rayane France
5 min readMar 14, 2021
Simone de Beauvoir

Recentemente aconteceu mais uma live de um movimento grande com líderes evangélicas influentes falando sobre Feminismo e Fé, mas esse texto não é sobre elas. A questão é que sempre que essa pauta é levantada em alguma roda de conversa evangélica, muitas mulheres se perguntam quais as leituras que precisam fazer, bons livros cristãos sobre o assunto, por onde começar, etc… eu mesma já recebi várias dessas perguntas e esse texto é uma resposta, em formato de reflexão, a esse questionamento.

Pense comigo, se uma pessoa que não é cristã, te pedisse a indicação de qual livro ler para entender o cristianismo e o Evangelho como um todo, qual seria a sua resposta?

Bom, EU indicaria a Bíblia, mesmo que a pessoa não tivesse nenhum traço de fé ou algo parecido. O melhor caminho seria partir do princípio e depois, caso houvesse desejo, continuar em leituras de textos apócrifos, etc.

O motivo é simples: toda escrita secundária é proveniente de um ponto de vista, um recorte, que raramente vai ter como assumir um compromisso de compreender 100% da realidade. Um autor falando sobre a Bíblia não vai ser mais assertivo sobre a história bíblica do que a própria Bíblia. Faz sentido?

Mas quando o assunto é feminismo, essa lógica básica é deixada de lado. Assim como em todos os movimentos, a História aqui é peça fundamental para seu entendimento sobre o tema, e quanto mais recortes, mais genérica a visão.

É impossível, IMPOSSÍVEL, compreender o feminismo lendo apenas um livro sobre o assunto, ainda mais um “livro cristão”, que é cheio de recortes e deixa de fora vários outros. A figura feminina na história da humanidade é marcante e sensível, com milhares de peculiaridades, transformações, contextos sociais, diferenças de classe, de raça…muitos aspectos que precisam ser analisados em conjunto e que não cabem numa interpretação simplória, como a que vemos nas leituras de autoras cristãs sobre o tema.

Do meu ponto de vista pessoal, nenhuma mulher tem necessidade e obrigação de ler todas as autoras clássicas para se considerar feminista, mas caso ela queira ser uma ativista ou algo do tipo, naturalmente irá buscar se aprofundar nos textos para entender a construção do tema, concordando ou discordando do que está escrito. Assim, mulheres cristãs, especialmente líderes, deveriam tomar o cuidado de não simplificar assuntos tão complexos com uma mera indicação de um livro da Ana Campagnolo. Essas indicações podem até ser boas leituras, bons livros, mas não são suficientes ou essenciais para construir um ponto de vista honesto.

Tampouco resumir tudo o que uma mulher cristã precisa saber sobre o feminismo no livro “Feminilidade Radical”, que acho especialmente perigoso por ser um livro que não tem nada a ver com o contexto social e cultural da mulher brasileira. Não se aplicam às diferenças de gênero e especialmente de raça que vemos no Brasil, um dos países que mais mata mulheres no mundo.

Carolyn McCulley, autora de Feminilidade Radical, disse em entrevista recente que hoje mudaria ou acrescentaria algumas coisas em Feminilidade Radical, publicado originalmente há 10 anos. Particularmente não é uma leitura ruim, é honesto quanto ao contextfxto histórico mas falha na sua aplicação à vida prática da mulher nos dias de hoje. Há problemas sérios de contextualização, um exemplo que me marcou foi sobre divórcios nos Estados Unidos, cujo a grande maioria é uma decisão da mulher, que seriam as culpadas por essa ruptura do vínculo familiar, influenciadas pelo feminismo; esse é um trecho bastante perigoso de se ler no Brasil, já que como disse, nossos casos de violência doméstica, inclusive em lares evangélicos, são altíssimos. Infelizmente homens brasileiros preferem trair, manter duas famílias, abusar, agredir… do que se divorciaram, e claro que cabe a mulher tomar uma decisão. É triste ler que a culpa do fim do casamento é do feminismo e não do homem que não cumpriu com sua promessa diante de Deus e da sociedade. Outro ponto problemático (com ressalvas) é que Carolyn não tinha filhos ou esposo na publicação original, e os conselhos do livro são muito romantizados, para alguém que só observa a realidade de fora.

Não acredito que mulheres cristãs tem a necessidade de entender sobre feminismo (além do básico, que a sociedade nos empurra), por mais que recomende, inclusive para que não caiam no conto do vigário do antifeminismo de pastoras lindas, loiras, magras e ricas que acham que entendem a realidade de uma mulher periférica (perdão, eu realmente não queria falar sobre elas).

Então, o que uma mulher cristã que quer entender o feminismo (sendo feminista ou não) precisa ler? Livros feministas e a Bíblia, oras!

Livros que contam a história do movimento, seu desenvolvimento, autoras clássicas, autoras contemporâneas, assistir documentários, filmes… não com o intuito de concordar com tudo ou discordar de tudo, mas aprender como se aprende História, e filtrar o que for bom, como a própria Palavra nos ensina.

E se aprofundar nas escrituras bíblicas, claro. Se eu quero saber os pensamentos de Deus sobre algo, o caminho é conhecer Deus e o entender o “algo”, como tudo na vida.

Vou listar leituras, textos, séries e materiais que acredito que sejam um bom ponto de partida para entender o Feminismo hoje, e de novo, não que eu concorde ou discorde de tudo, mas faz parte para quem quer criar um pensamento crítico sobre determinado assunto, não é mesmo?

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Rayane France

brasiliense, 95’s, criativa, meio artista, meio escritora, beyhive e de Jesus